O relógio marcava onze horas, e era o último trem. Apesar de correr a plenos pulmões, quando cheguei à estação, o trem já fazia a curva e a fumaça se espalhava pelo vale.
Fiquei desolado. O que iria fazer sozinho naquela estação, àquela hora da noite?
A estação era escura, lúgubre. A umidade tomava conta das paredes. Por ser muito antiga, algumas paredes já haviam desabado.
Então, tive uma sensação estranha. Alguém me observava.
O sentimento era sufocante.
Comecei a suar, apesar do frio que a noite trazia.
Minha garganta estava seca; precisava de água.
Olhei em volta e, na penumbra, vi uma porta que deveria ser um banheiro.
Fui até lá, e realmente era o banheiro masculino.
Entrei, ainda me sentindo mal.
O lugar estava em péssimo estado. O cheiro era insuportável, o que me fez sentir ainda pior. O chão estava coberto de água suja, misturada com fezes espalhadas por todo canto. Ratos nem se davam ao trabalho de se afastar quando percebiam minha presença. Também havia baratas do tamanho de gafanhotos.
Eu me sentia atordoado pelo mal-estar, agravado pelo cheiro fétido, pela sujeira, pelos animais e pelos insetos.
De repente, virei-me em direção à porta e percebi que não estava sozinho.
Minha primeira visão foi de um par de olhos ameaçadores. A tez branca e retesada era a personificação do mal que, ainda há pouco, eu sentira lá fora.
A figura era a de um homem com roupas maltrapilhas, exalando um cheiro ainda mais forte do que o que eu já sentia.
Tudo aconteceu muito rápido. Percebi que ele segurava um pedaço grande de madeira.
O golpe veio rápido, mas tive tempo o suficiente para entender o que estava por acontecer e acompanhar a trajetória da madeira em minha direção.
O impacto foi muito forte. Da minha cabeça voaram pedaços. Meu cérebro se esfacelou, e o corpo colapsou.
A água fétida recebeu meu corpo. Enquanto caía, consegui visualizar minha mãe cuidando de mim quando criança. Senti-me jovem, já adulto, e então uma luz muito forte perpassou meu corpo, embora eu ainda percebesse que o banheiro continuava tão escuro quanto antes.
A luz me elevou, e vi meu corpo caído, sem vida, na escuridão. A sensação era boa, quase libertadora, e a dor sentida já ficara para trás.
Mas então ouvi uma voz que parecia vir de todos os lados:
— O trem sempre leva quem chega atrasado.